Escuta Educativa - Programa da Rádio Educare.47 do Instituto de Educação de Minas Gerais

segunda-feira, 11 de março de 2019

LIVRE COMÉRCIO E TRATADO DE METHUEN; A VISÃO DE WASHINGTON ALBINO PARA SUPERAÇÃO DO COLONIALISMO NO BRASIL



LIVRE COMÉRCIO E TRATADO DE METHUEN
A VISÃO DE WASHINGTON ALBINO PARA SUPERAÇÃO DO COLONIALISMO NO  BRASIL

Wladmir Coelho

Em tempos de aclamação do neoliberalismo e recorrente ataque a chamada intervenção do Estado na economia relembro a obra do professor Washington Peluso Albino de Souza denominada “Ensaios sobre o ciclo do ouro: fenômeno cultural mineiro e o Tratado de Methuen” publicada em 1979.

Neste texto focalizarei a segunda parte da citada obra dedicada a analise do Tratado de Methuen e a crítica do autor a abordagem do tema por Adam Smith em seu “Inquérito sobre a natureza e as causas riqueza das nações” ou simplesmente “A riqueza das nações” bem como a forma de apropriação do texto do pensador britânico pelas classes dominantes brasileiras.

A crítica de Souza completa-se analisando a tradução do livro de Smith por Bento da Silva Lisboa o Barão de Caiuru, em 1811, apresentando esta a omissão dos aspectos considerados negativos à economia portuguesa decorrentes da assinatura do Tratado de Methuen.

A omissão ou cortes de trechos é justificada pelos autores em função da tradução apresentar-se como um compendio, contudo Souza revela a preocupação destes em ocultar exatamente as passagens nas quais evidenciam-se os prejuízos de Portugal decorrentes do citado tratado com especial destaque a utilização do ouro de Minas Gerais como elemento financiador da consolidação do processo de industrialização inglesa.

Esta omissão podemos associar, inicialmente, a condição oficial da tradução editada pela “Impressão Régia” evitando seus autores possível veto ou futuros constrangimentos em função das inevitáveis críticas aos ilustres antepassados do Príncipe Regente.
A análise de Souza vai apontar a omissão como resultante da ideologia liberal a qual eram filiados os autores resultando este fato em adequação forçada da realidade aos elementos fundantes do citado pensamento.

O próprio Smith, devemos recordar, ignorou ou omitiu – Souza defende a segunda opção – as consequências do ouro de Minas carreado à economia inglesa aplicando prática semelhante de análise de seus nobres admiradores de 1811.

O Tratado

O Tratado de Methuen fora assinado em 1703 e desta data a publicação da Riqueza das Nações decorreram-se 70 anos e Smith, em seu esforço de adequar a realidade a ideologia, subestima  aspectos de amplo conhecimento relativos a exploração aurífera de Minas Gerais levando Souza a seguinte conclusão: “Tudo isto leva-nos a situar Smith, neste particular, como um tanto simplista e em desacordo com a acuidade revelada para outros problemas analisados em profundidade.
O Tratado de Methuen, revela Souza, ocorre de forma simultânea as notícias de descoberta do ouro em Minas Gerais, possuindo os britânicos informações do achado e da importância deste fato que elevou o Brasil ao “centro de atrações e de interesses do mundo europeu capitalista, em formação sobre bases mercantilistas.”

Temos ainda neste contexto a disputa entre a Inglaterra e a França considerando o acesso do segundo à prata espanhola originária das colônias na América criando os meios de acumulação, ao modo mercantilista, necessários ao fortalecimento das iniciativas industriais francesas.

Os franceses, quanto a importância do ouro de Minas Gerais, possuíam informações e interesses em domina-lo conforme aponta Souza:

“(...) A correspondência de Ambroise Jauffret com o Primeiro Ministro daquele país e a atuação de Duguay-Trouin, armado em corso após entrevista secreta com Luiz XIV, são outros pontos a serem melhor estudados para demonstrar que a região do ouro brasileiro não se comportava na visão europeia como simples ponto distante de colônia portuguesa, mas assumia posição de interesse e alimentava a consciência de sua importância diante das demais nações europeias.”

Vejamos neste ponto que ignorar a importância econômica do ouro brasileiro adotando visão “simplista” de Smith vai implicar em adoção histórica dos conceitos liberais omitindo, por exemplo, a presença do Brasil “na configuração da revolução industrial inglesa do fim do Sec. XVIII e no quadro da formação do capitalismo moderno” aponta Souza.

O estudo da obra de Smith no Brasil, indica o professor Washington Albino, foi iniciado a partir da simples submissão ao “colonialismo cultural” partindo da omissão de base ideológica impedindo esta a crítica a forma adotada pelo autor de A riqueza das Nações em sua análise do Tratado de Methuen.

Smith vai apresentar uma análise do Tratado de Methuen no capítulo VI do livro IV da Riqueza das Nações no qual analisa os sistemas de economia política dedicando espaço a crítica do Mercantilismo criando deste modo as condições para a legitimação de sua posição liberal.

A respeito do tratamento oferecido por Smith ao estudo do Tratado de Methuen o professor Washington Albino realiza uma análise comparativa entre o original e aquele traduzido em 1811 concluindo que o “tradutor podou trechos do original justificando este procedimento pela adoção do título de compendio.
Destes trechos podados, cinco em sua totalidade, vamos destacar aquele cuja contradição analítica de Smith vai apontar a posse do ouro originado de Minas Gerais como principal objetivo do citado tratado.

Smith inicia o citado trecho apresentando sua conhecida opinião contrária aos tratados internacionais associando estes à prejuízos ao conjunto da economia visto o comprometimento da livre concorrência, contudo abre uma exceção ao tratado de Methuen:

“(...) Alguns tratados de comércio, todavia, têm sido considerados vantajosos com base em princípios muito diversos; e um país comerciante admite, às vezes, um monopólio desta espécie, contra o seu próprio interesse, para certas mercadorias de uma nação estrangeira, porque espera que a totalidade do intercâmbio comercial entre ambas, venda anualmente mais do que compre e que a balança em ouro e prata possa ser anualmente a ela favorável. Com base nesse princípio, foi que o Tratado de Comércio entre a Inglaterra e Portugal, concluído em 1703, por Mr. Methuen, tem sido elogiadíssimo.”

Segundo Souza a exceção apontada por Smith resulta do uso de “argumentos liberais, nesse trecho, para combater as vantagens obtidas pela posição inglesa, mas acabou sendo traído pelos próprios argumentos mercantilistas. Aí está o erro ou a má fé com que se conduziu na análise, pois que aceita certas teses que favorecem o ponto de vista do Mercantilismo ou, pelo menos, não coincidente com o pretendia demonstrar, que era a posição desvantajosa para a Grã-Bretanha.”

Completando Washington Albino afirma: “Se afirma que os lucros ingleses poderiam ser maiores no caso de ter sido adotada a livre concorrência, reconhece, entretanto, que o Tratado de Methuen garantiu o recebimento do ouro e prata por esta nação.”

Devemos ainda considerar que envolvendo a livre comercialização do vinho português em território inglês em troca da entrada dos tecidos deste país em Portugal os primeiros garantiam o acesso ao mercado que iniciara-se, no Brasil, em função da exploração aurífera fato que elevou substancialmente no número de habitantes na região das Minas.

Como sabemos as regiões dedicadas a exploração do ouro não apresentam como característica a diversificação produtiva ficando desta forma a população da região, Souza aponta pelo menos meio milhão de habitantes nas Minas, vestidos todos com tecidos de origem inglesa.

Retirados de Minas Gerais o ouro e a prata terminaram oferecendo à Inglaterra os meios para acumulação e deste a condição de destaque no comércio mundial considerando a compra de mercadorias das Índias e da China somado a criação de um monopólio para seus tecidos em Portugal e suas colônias e destas, através do descaminho, a penetração em áreas de controle espanhol na América do Sul.

Em seu trabalho o professor Washington Albino aponta a necessidade de rompimento com o modelo analítico que restringe o estudo da consolidação do capitalismo a partir das antigas metrópoles revelando no saque aos países americanos a base para a acumulação e consequente desenvolvimento da indústria e comercio inglês e deste ao imperialismo.

Destas analises de caráter histórico decorrem os fundamentos da obra geral do professor Washington Peluso Albino de Souza pautada na necessidade do rompimento do modelo de exploração de base colonial ainda presente no Brasil e neste momento agravado em função da eliminação dos instrumentos mínimos de enfrentamento ao imperialismo.

A defesa do planejamento econômico também apresenta-se na obra do professor Washington Albino como importante recurso à superação do modelo econômico de base colonial necessitando este de clara definição e proteção estatal dos recursos estratégicos.

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